No início do século XXI, uma turma de amigos, compositores e poetas, transformou um infecto boteco da Rua Caiubi no bairro de Perdizes em São Paulo, num point cultural que logo chamou a atenção de artistas e mídia, num movimento que agitou a noite paulistana, se apresentou em diversos espaços da cidade e depois ainda evoluiu para se tornar numa rede social de alcance mundial, ainda naquela década de 2000. Esta é uma pequena história do movimento Clube Caiubi, contada por cinco de seus ilustres integrantes: os cantores e compositores Tato Fischer, Sonekka, Nando Távora e Ricardo Moreira e a fotógrafa Helena Borges
Como você ouviu falar e foi parar no Caiubi?
Tato Fischer: Na lista de discussões da internet M-Musica, sempre o Sonekka falava do Clube Caiubi. Zé Rodrix foi logo cooptado para o Clube. Eu levei mais tempo, por ensaiar às segundas-feiras com o Grupo Vocal Amídalas Cantantes, de Santo André. Quando comecei a trabalhar com o Leo Aguiar, abriu-se a possibilidade: chegava do ensaio e tinha a carona dele pra irmos à Rua Caiubi. A partir daí comecei a frequentar regularmente. Delícia!
Ricardo Moreira: Fui parar no Caiubi por meio da caótica RSMB (Rede Solidária da Música Brasileira), criada pelo saudoso Madan. Minha estreia caiubal ocorreu num dia em que a cantora Lis Rodrigues comemorava o lançamento de um CD(Rom…rs)
Nando Távora: Eu ouvi falar do Caiubi ouvindo uma entrevista na rádio de São Paulo do Dori Caymmi. Ele estava junto com o irmão dele, o Danilo, e também com o [Renato] Braz. E ele falou do Caiubi. Aí, enquanto eu não descobri onde era, eu não descansei. Até que um dia que eu fui acompanhar o Ronaldo Raiol numa apresentação de uma cantora ali no Vão Livre do Masp, ela me falou do Caiubi, e aí marquei com ela, ela me deu carona, e eu fui, conheci o Caiubi.
Sonekka: Eu e o Zé Edu frequentávamos o Bar do Cidão, exatamente onde é hoje o Julinho Clube. Lá tocava o Marcos Oliva com quem fizemos amizade. Ele que convidou pra aparecer neste encontro de compositores e lá fomos nós.
O que você viu / gostou lá que resolveu frequentar?
Tato Fischer: O encontro, a grande troca entre os compositores, as possibilidades grandes de crescimento das parcerias, os grandes amigos que fui fazendo por lá, as músicas que iam nascendo na nossa frente! Tudo isso foi um brilho só e me encantou para sempre!
Ricardo Moreira: O legal do Caiubi, além da amizade e da cachaça, é que, apesar de ser um ambiente de música, não me lembro de ouvir alguém falar de escalas, modos gregos, sustenidos e bemóis… Os artistas descem do palco, e o assunto se volta aos temas cotidianos. Papo de músico com músico,invariavelmente, é chato pra cacete e exclui do papo todo aquele que só está lá acompanhando os “conjes”.
Nando Távora: E lá no Caiubi foi que eu descobri realmente a minha capacidade de compor com letras de outros amigos. Fiz grandes amigos.
Sonekka: As músicas eram legais e o bar era fuleiro do jeito que a gente gosta. Tinha um clima.
Qual a lembrança do convívio com Zé Rodrix, Tavito e outros figuraças que frequentavam o Clube?
Tato Fischer: Muito ricas essas lembranças. Vendo a peça Elis semana passada, impossível conter o choro no encerramento do primeiro ato com Casa no Campo. Os três tínhamos a mesma idade. E isso pega fundo!
Ricardo Moreira: Histórias pra contar. Tive a sorte de ter um carro utilitário na época em que o Zé Rodrix participava dos Tropeçalistas e eu ficava incumbido de ir buscá-lo para os shows, junto do seu “esquife” (case do teclado). No caminho, o Zé contava os “segredos” do mainstream, mas, melhor ainda, o Zé ouvia muito também e roubava pra ele as piadas boas.
Nando Távora: […] o Zé Rodrix foi muito generoso e fez uma parceria comigo no samba Paletó de Brim. Ele escreveu a letra, me convidou para ir na casa dele, eu fui até a casa dele, tenho a letra dele guardada.
Sonekka: Bom, eu tenho memórias gigantes de todos os momentos. Era mais fascinado pelo Zé Rodrix, mas convivi intensamente com o Tavito em toda sua vivência em São Paulo, chegando inclusive a viajar muito com ele para júri de festivais.
Na sua opinião qual o grande momento/evento do Clube?
Tato Fischer: Foram muitos os momentos especiais, principalmente após estarmos no Vila Teodoro/ Villagio. Mas destaco os shows do Crowne Plaza, o show realizado em Perdizes (Rua Monte Alegre), o do Café Piu-Piu e meu encontro com a Nega Lucia Helena Corrêa, LHC, para dirigir seu show. Mas cada passo do Caiubi foi marcante: no Saracura, no Caiubi Peixoto, no Vila Teodoro, no Lua Nova, no Bagaça, no Julinho Clube. Só não conheci um espaço em que o Caiuba ficou muito pouco tempo, creio que antes do Vila Teodoro, nem sei o nome.
Ricardo Moreira: O grande momento (até o que está por vir…rs) foi quando virou atração na MTV, no Metrópolis (TV Cultura).
Nando Távora: O Caiubi, em seu terceiro ano, estava bombando nas Segundas Autorais e os caiubistas começaram a ampliar as atuações em outros dias da semana. Foi quando tivemos a ideia de fazer a Roda de Samba às terças-feiras, contando com a colaboração do Daniel Altman, no sete cordas, e do Edu Batata no cavaquinho, e também com outros músicos de percussão que eles trouxeram. A Roda de Samba não teve uma duração muito prolongada em termos de meses, mas foi bastante animada enquanto durou. Inclusive, teve noite em que contou com a presença de figuras que estavam começando a se despontar no cenário musical de São Paulo, como Verônica Ferriani e o pessoal do Quinteto em Branco e Preto. E não posso deixar de lembrar que o grande Affonso de Moraes fez um samba especialmente para a Roda de Samba, chamado Terço na Terça, um samba antológico que você pode até ouvir no Spotify.
Sonekka: Seleciono dois: Os Tropeçalistas no Supremo e quando o Clube Caiubi online bombou e começou a chamar muita atenção.
O que ficou de legado do auge do Clube na década de 2000?
Tato Fischer: Fundamentalmente os queridos amigos, de quem sinto muita falta! Por isso muito me alegrou a ideia de revitalizar o Clube! PARABÉNS, Ricardo e Sonekka… Sonekka é o único com quem me encontro sempre, ainda que fora da categoria Caiubi…
Ricardo Moreira: Parcerias, amizades e uma ressaca desgraçada…rs
Nando Távora: São muitas histórias e grandes amizades que permanecem até hoje, tá certo? O que fica de legado no Caiubi é a parceria e a amizade.
Sonekka: A certeza da semente bem plantada de resistência da canção brasileira, do legado de originalidade e qualidade.