Juli Manzi: As Aventuras de um Freak no Underground Paulistano

Ouvi falar do Manzi pela primeira vez na época do Festival da Cultura, pelos idos de 2005, ele não participou mas tinha lá uma galera de Campinas que tinha um movimento musical chamado Ovo Novo do qual ele fazia parte. Ou não, essa coisa de movimentos musicais parece mesmo coisa de quem estava em determinado bar, deteminada noite. Ficamos amigos e lá se vão quase 20 anos. Participei da gravação de um vídeo-clipe dele, tomamos várias cervejas em nome da alta clutura e até vimos juntos o glorioso coloradinho ganhar um GreNal no estádio Pacaembu e se sagrar campeão da Copinha São Paulo. E perdi com ele a chance de conhecer pessoalmente o Júpiter Maçã, quando furei de ir no show que um fez com a participação do outro no SESC Santana, em Sampa, na época em que o Manzi já estava escrevendo a biografia do Flavio Basso, que ninguém imaginava que fosse morrer alguns meses depois. Perdemos um pouco de contato depois da pandemia, mas nunca deixei de acompanhá-lo pelas redes. Pra além de amigo, Manzi trabalha com arte e artistas de talento e coragem, nomes de peso e história e totalmente fora do mainstream. Agora para o relançamento do site do Caiubi, dei um zap nele pra me atualizar das coisas manzineiras. Faltou o mate (ou a cerveja sem álcool turbinada com shots de cachaça depois que acabaram as “cervejas de verdade” – conto essa história outro dia) mas segue abaixo a rápida conversa com o jovem mestre: (Rica Soares)

 

Clube Caiubi:  Ouvi há pouco seu último single, A Cor do Som. Bela canção, bonito clipe. Como foi o processo de criação e produção?

Juli Manzi: Era um domingo à tarde e eu estava deitado em casa tentando descansar enquanto uma vizinha aprendia a tocar teclado. Ela era iniciante e praticava uma sequência de dois acordes: mi menor e lá maior. Não é uma combinação muito usual e aquilo chamou a minha atenção. Imaginei um blues com esses dois acordes e comecei a fazer a letra ali deitado mesmo, ouvindo ela tocar e com uma preguiça tremenda de ir até o meu violão. No final do ano passado entrei em estúdio com o pessoal da minha banda (Gongom, Tonho Penhasco e Maumau) e gravamos esse blues, sob a batuta de Felipe Faraco, que também gravou o teclado e assinou a produção. Depois, acrescentamos os backings da Kika e da Ciça Góes, e a participação de Daniel Perroni Ratto, que recitou um poema criado por ele para a ocasião. O clipe foi feito por uma equipe de ex-alunos meus da faculdade de Jornalismo, a gente tem uma excelente relação e foi muito bom trabalhar com eles. Iniciativas como essa só se tornam possíveis com muita boa vontade e a participação de uma rede de colaboradores.

Clube Caiubi:  Sem rotulção, claro, como você posiciona o seu som no cenário musical hoje?

Juli Manzi: Alternativo, independente, underground, contracultural , marginal, acho que qualquer uma dessas expressões serve. Não estou sintonizado às tendências mercadológicas e transito intuitivamente por gêneros musicais das últimas sete décadas, sempre dando especial atenção às letras. Talvez essa diversidade toda de gêneros não tenha me ajudado muito na definição de uma identidade musical, o que facilitaria a comunicação com o público. Mas não considero a minha música muito esquisita, diferente ou difícil de digerir.

Clube Caiubi:  Li um manifesto seu outro dia nas redes sociais sobre a importância de persistir fazendo arte. Como é esse sentimento e como ele evoluiu ao longo da sua já longa carreira?

Juli Manzi: Ele não evoluiu. Talvez até tenha involuído ao longo desses 30 anos de carreira, mas não o suficiente para me fazer abandonar. Nunca fiquei doze meses sem fazer show, por exemplo. Mas tenho que adequar minha produção à carreira docente paralela. A persistência decorre da percepção de eu ter chegado a um momento da vida em que ficou tarde demais para fugir e abandonar tudo o que fiz. A vida já é uma coisa sem sentido, sem a arte fica pior ainda.

Clube Caiubi:  Paralelo ao trabalho de cantor/compositor você desenvolve outros, notadamente o de escritor, você escreveu uma biografia do Júpiter Maçã que já está na segunda edição. Conta dessa experiência e se dá pra esperar mais de você nessa praia.

Juli Manzi: Escrevi com o Júpiter um livro de memórias ficcionais dele chamado Odisseia, que está na terceira (e luxuosa) edição. Adoro escrever embora seja trabalhoso, demorado e não dê um retorno financeiro que justifique o esforço. Agora estou começando um livro intitulado Aventuras de um Freak no Underground Paulistano.

Clube Caiubi:  Compartilha com a gente alguns nomes (dois ou tres) de artistas que você acha que as pessoas deveriam estar curtindo mais por estes dias.

Juli Manzi: Gabriel Serapicos, Irmão Victor e Bruna Lucchesi.

Clube Caiubi:  Planos?

Juli Manzi: Já tem show marcado para maio. E vou lançar mais um single com videoclipe, que está no forno. Estou começando um novo projeto em duo com Rodrigo Caldas, da banda Bazar Pamplona, vai ser um desafio diferente. Pretendo continuar dando aula para sobreviver e, um dia, abrir um espaço cultural em alguma praia do litoral norte.

Yamandu Costa, Juli Manzi, e Júpiter Maçã no camarim do SESC Santana - reprodução Facebook
Yamandu Costa, Juli Manzi, e Júpiter Maçã no camarim do SESC Santana – reprodução Facebook

 

Juli Manzi é compositor e cantor gaúcho radicado em Sampa que mistura rock com gêneros da música brasileira. Lançou seis álbuns solo, dois singles e sete videoclipes. Fez canções para teatro e cinema, e realizou o nanopoema Infinitozinho, menor poema da língua portuguesa, inspirado na obra de Arnaldo Antunes. Junto com o roqueiro Júpiter Maçã, escreveu o livro Odisseia: Jupiter Apple History. Tocou no ISIM Festival (Chicago) e no Oslo World Music Vorspiel (Noruega). Lançou recentemente o single e clipe Cor do Som, pelo selo Selinho, distribuído pela Tratore. Leciona em cursos de Artes Visuais e Comunicação Social.

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